Cientistas buscam rocha para “enterrar” CO2 no subsolo por ao menos mil anos
Cientistas buscam rocha para “enterrar” CO2 no subsolo por ao menos mil anos
Pesquisadores estão na fase de recolher amostras e observar as condições geológicas dos locais estudados. Depois de ensaios de laboratório e simulações computadorizadas, dados obtidos integrarão um atlas – Arte sobre foto/Divulgação Research Centre for Gas Innovation
Pesquisadores que participam do Centro de Pesquisa para Inovação em Gás (RCGI, na sigla em inglês) estão procurando um método para reduzir consideravelmente a chegada à atmosfera do gás dióxido de carbono (CO2) emitido na região Sudeste do Brasil. A proposta é identificar quais rochas poderiam guardar de forma segura uma porção significativa do CO2 liberado pela indústria, retendo-o por pelo menos mil anos. A pesquisa engloba duas regiões onde há rochas que poderiam armazenar o gás: a Bacia Sedimentar do Paraná, cuja extensão vai do Mato Grosso até a Argentina, e a Bacia de Santos, de onde se extrai petróleo tanto no pré-sal quanto no pós-sal.
O projeto, que está sendo realizado no Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP, segue uma linha de pesquisa chamada de Captura e Armazenamento de Carbono (CCS, do inglês carbon capture and storage). A CCS consiste em um conjunto de métodos e tecnologias para capturar o dióxido de carbono na fonte emissora – uma siderúrgica, por exemplo -, transportá-lo e estocá-lo em um local adequado.
Campos de petróleoBacia Sedimentar do Paraná e a Bacia de Santos analisadas na pesquisa – Foto: Wikimedia Commons
Soa curiosa a ideia de “enterrar” um gás no subsolo, mas a proposta não é ficção científica. As tecnologias de CCS são irmãs daquelas utilizadas pela indústria de petróleo e gás.
Segundo o geólogo Colombo Celso Gaeta Tassinari, diretor do IEE e coordenador do projeto, um tipo de reservatório geológico que costuma ser avaliado para armazenar CO2 é justamente a própria rocha que contém petróleo. Em alguns casos, um campo de petróleo desativado pode servir como reservatório do gás carbônico.
“O problema aqui no pré-sal é que o petróleo já tem muito CO2 naturalmente. Começar a reinjetar mais CO2 nessas rochas vai piorar cada vez mais a qualidade do óleo. Então, no caso específico da Bacia de Santos, não é recomendável fazer isso”, explica Tassinari. Problema semelhante ocorre com outro tipo de rocha encontrada na região, a do aquífero salino. Por também estar associada a uma camada de petróleo, a injeção de CO2 pode igualmente prejudicar a qualidade do óleo.
Gás bem guardado
Há um terceiro tipo de rocha com potencial para armazenar dióxido de carbono, presente em duas unidades geológicas da Bacia do Paraná. É o chamado folhelho negro – uma rocha sedimentar argilosa rica em matéria orgânica, que tem alta porosidade, mas não tem permeabilidade. Ao contrário do que ocorre nos outros tipos de rochas, nos folhelhos negros o gás e o óleo não conseguem migrar com facilidade pelos poros, pois as partículas de argila envolvem as moléculas dessas substâncias.
É desse tipo de rocha que, nos Estados Unidos, se extrai o shale gas, popularmente conhecido como gás de xisto – que é o metano, basicamente. A técnica de extração mais utilizada por lá é gerar pequenas fraturas na rocha com a força da água. O chamado fraturamento hidráulico é usado justamente porque as rochas são impermeáveis.
“Nós temos que fazer um poço, que normalmente começa vertical até atingir a camada que está a 2 mil metros de profundidade, por exemplo. Quando atinge essa camada, esse poço vira horizontal e entra por dentro da camada por até um quilômetro e meio. Depois, são feitas pequenas explosões na parte horizontal desse poço, dentro da camada de que se quer retirar o gás. Essas explosões é que vão gerar pequenas fraturas na rocha”, explica o diretor do IEE.
Após essas explosões, é injetada uma grande quantidade de água com areia. Quando essa água entra com grande pressão dentro do poço, ampliam-se as fraturas que foram geradas inicialmente. “Os grãos de areia vão impedir que essas fraturas se fechem pela pressão que vai estar lá embaixo. E por aí vai sair o metano”, detalha Tassinari, e acrescenta que o mesmo processo pode ser utilizado substituindo a injeção da mistura de água com gás pelo bombeamento de CO2 em alta pressão.
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Próximos passos
Nesta etapa do projeto do RCGI, os pesquisadores estão recolhendo amostras e observando em campo as condições geológicas dos locais estudados. As amostras serão submetidas a ensaios de laboratório, cujos resultados serão utilizados para gerar simulações computadorizadas do fluxo de CO2 nas rochas e possibilidade de escape. Os dados obtidos integrarão um atlas, a ser publicado no final do projeto.
De acordo com Tassinari, o investimento em pesquisa para aplicação de CCS deve ser encarado como uma atitude ambientalmente correta, uma vez que abre uma saída sustentável para reduzir a emissão de gases de efeito estufa.
“Se uma usina termelétrica estiver situada em um terreno acima dessas rochas favoráveis, podemos pegar esse CO2 emitido pela termelétrica e reinjetar lá embaixo. Ele nem vai para a atmosfera”, diz o docente. “Podemos fazer um sistema fechado, por exemplo. Se esse poço foi usado para a retirada do metano, está bom porque viabiliza economicamente essa injeção. Se não for, o lucro é gerado ao armazenar CO2, que é o lucro ambiental, em créditos de carbono”, completa.
A pesquisa do RCGI é financiada pela Fapesp e pela Shell.
Por Silvana Salles | JORNAL DA USP